JORNAL DA USP: Na região de Bauru, Faculdade de Medicina da USP e Hospital das Clínicas reforçam o atendimento à saúde
Nova unidade de ensino e pesquisa, criada em março deste ano, vai atuar em sintonia com as necessidades do hospital e da população local
Por Herton Escobar / Jornal da USP
A criação de uma escola de medicina da Universidade de São Paulo (USP) em Bauru era uma demanda histórica da população local – não só do próprio município, mas de todo o seu entorno. “Desde que eu era pequena eu escutava falar que ia ter um curso de medicina (aqui), então é um desejo muito antigo da nossa região”, diz a professora e diretora da Faculdade de Odontologia de Bauru (FOB), Marília Buzalaf – uma “bauruense da gema”, nascida e criada na cidade.
O sonho começou a se tornar realidade em julho de 2017, com a criação do curso de Medicina da USP em Bauru, inicialmente vinculado à FOB; e se concretizou em definitivo em março deste ano, com a criação da Faculdade de Medicina de Bauru (FMBRU), que passa a abrigar integralmente o curso. “Houve uma conjunção de fatores que, felizmente, permitiu que houvesse a criação da faculdade e a materialização de um sonho tão antigo da nossa comunidade”, comemora Marília.
A primeira turma do curso se formou em novembro de 2023, com 52 alunos diplomados. Somadas todas as outras turmas que se iniciaram desde 2019, a FMBRU já nasce com 350 alunos e o terceiro curso mais concorrido da USP, atrás apenas da Medicina de São Paulo e de Ribeirão Preto. Sessenta calouros são admitidos por ano. “Com certeza a criação da Faculdade de Medicina vai permitir um crescimento e um desenvolvimento muito melhor para o curso”, avalia Marília. “E com certeza isso também vai beneficiar toda a população com atendimento de qualidade, porque a gente sabe que onde a USP vai e onde ela leva cursos de saúde, esses cursos têm um nível de excelência incomparável.”
A FMBRU funcionará em parceria umbilical com o também recém-criado Hospital das Clínicas de Bauru (HC Bauru), que fica dentro da campus da USP e servirá como um hospital-escola para a capacitação dos alunos de graduação e a qualificação de residentes. Atualmente com 128 leitos e mais de 1 mil funcionários, o HC Bauru foi formalmente criado em julho de 2018 e entrou em operação em agosto de 2022, sob gestão da Fundação de Apoio ao Ensino, Pesquisa e Assistência do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (Faepa).
“O momento é de muita integração”, diz o professor José Sebastião dos Santos, docente da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP) e diretor pro tempore da FMBRU. Tanto a faculdade quanto o hospital, segundo ele, deverão atuar em sintonia com as demandas locais e regionais do Sistema Único de Saúde (SUS); desde a concepção dos currículos e dos projetos acadêmicos até a contratação de docentes (por parte da USP) e dos profissionais de saúde (por parte do hospital) que vão atender a população.
“Nós estamos muito atentos a isso: ao que o hospital precisa e ao que a cidade e a região precisam. Os interesses são convergentes”, destaca Santos. Segundo ele, a USP reforçou nos últimos anos uma percepção de que ela precisa ter um diálogo mais próximo com as necessidades da população. “E essas necessidades, queiramos ou não, estão representadas em ações que estão previstas nas políticas públicas.”
Uma demanda específica que já foi identificada nesse diálogo, por exemplo, é a necessidade de uma atenção maior às questões de saúde mental. Em resposta, o HC Bauru está montando uma enfermaria especialmente dedicada ao assunto e a FMBRU deverá contemplar o tema em suas decisões para contratação de docentes e formatação de currículos. “O sistema de saúde precisa, o HC também precisa, e portanto nós precisamos formar profissionais que tenham esse conhecimento sobre saúde mental”, conclui Santos. “Não vamos fazer uma faculdade isolada do contexto.”
Pedra fundamental
A pedra fundamental no processo de criação do curso, da faculdade e do HC Bauru é o Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais (HRAC) da USP, popularmente conhecido como Centrinho. Criado em junho de 1967, o HRAC é especializado no tratamento de fissuras labiopalatinas, anomalias craniofaciais congênitas e deficiência auditiva. Ao longo de sua história já atendeu mais de 100 mil pessoas, provenientes de todos os Estados do País, e tem atualmente mais de 15 mil pacientes ativos (em tratamento).
Em 2014, o Conselho Universitário da USP aprovou uma proposta de transferir a gestão do HRAC para a Secretaria Estadual da Saúde. O argumento fundamental era que a prestação de serviços de atendimento à saúde era uma atribuição do Estado, e não da universidade, que até a conclusão dessa transferência arcava com todos os custos de manutenção e operação do hospital.
Essa expectativa se concretizou em 2018, com a publicação do Decreto nº 63.589, que criou formalmente o HC Bauru e atribuiu a ele a responsabilidade de dar continuidade aos serviços prestados pelo HRAC. Uma convocação pública foi realizada para escolher a entidade que ficaria responsável pela gestão do novo hospital. A disputa foi vencida pela Faepa, que já administrava quatro hospitais do complexo de saúde do HCFMRP.
O HC Bauru entrou em operação em agosto de 2022 e assumiu oficialmente a gestão do Centrinho em fevereiro de 2023, “preservando e potencializando os serviços prestados”, segundo o Relatório Anual de 2023 do HRAC. “As atribuições de assistência à saúde foram incorporadas pelo HC Bauru, unidade da Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo, sob a gestão da Faepa”, descreve o documento. “Já as atividades acadêmicas – de ensino, pesquisa e inovação – permanecem sendo desenvolvidas pela Universidade de São Paulo. Este novo modelo, semelhante ao dos HCs da USP de São Paulo e de Ribeirão Preto, estabelece um avançado complexo acadêmico e de saúde e favorece a expansão dos cenários para a formação e especialização de novos profissionais da saúde, além de ampliar e diversificar a oferta de serviços, especialidades e atendimentos à população.”
A ideia, desde o início, era que o HRAC passasse a funcionar dentro do HC Bauru, nos mesmos moldes do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP (HCFMUSP), em São Paulo, e do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (HCFMRP), também da USP – em que a universidade entra com recursos humanos especializados (professores e alunos) e colabora na governança, mas quem administra e banca as despesas do hospital é o Estado, por meio de convênios firmados com fundações de apoio.
Desde 2022, quando o complexo hospitalar do HC Bauru entrou oficialmente em funcionamento (sob gestão da Faepa), a Secretaria de Estado da Saúde vem investindo na implementação e ampliação dos serviços prestados pelo hospital [com a inauguração de um Centro de Radiologia e Imagens Biomédicas, alas de internação e ambulatórios de diversas especialidades médicas, além de reformas e melhorias no centro cirúrgico e em vários outros espaços]. O custo operacional do hospital, que era de R$ 5,6 milhões em 2022, cresceu para R$ 66 milhões já em 2023, segundo a administração do HC Bauru. Os gastos da USP com o HRAC, que eram da ordem de R$ 15,7 milhões ao ano em 2022, caíram para R$ 198 mil, em 2024.
Em 2023, o complexo HC Bauru (que inclui as duas unidades) realizou cerca de 74 mil consultas e quase 3 mil cirurgias ambulatoriais. O atendimento é 100% gratuito, realizado pelo Sistema Único de Saúde (SUS).
“O HC Bauru é exclusivo aos usuários do SUS e recebe pacientes com descompensação clínica dos municípios do Departamento Regional de Saúde de Bauru (DRS 6) do Estado de São Paulo, encaminhados pelas unidades solicitantes conforme definição da Central de Regulação de Ofertas de Serviços de Saúde (CROSS)”, diz o site do hospital. “O projeto assistencial do Hospital das Clínicas de Bauru contempla o atendimento por equipe multiprofissional composta por médicos, enfermeiros, assistentes sociais, biologistas, farmacêuticos, fisioterapeutas, fonoaudiólogos e nutricionistas. Na área médica, atuam no HC Bauru especialistas em Cardiologia, Endocrinologia, Geriatria, Infectologia, Nefrologia e Pneumologia, em serviços de retaguarda em clínica cirúrgica para pacientes internados nas áreas de Cirurgia do Aparelho Digestivo, Cirurgia Pediátrica, Cirurgia Torácica, Cirurgia Vascular e Urologia.”
O novo hospital hoje está organizado em duas unidades: a Unidade Centrinho, onde o HRAC segue funcionando como sempre, num prédio de 2 andares e 11.750 metros quadrados; e a Unidade Clínicas, que funciona num prédio vizinho de 11 andares e 22 mil metros quadrados. Esse segundo edifício, popularmente conhecido como “predião”, foi construído em 2012, mas nunca havia sido ocupado integralmente – apenas os dois andares mais baixos eram usados pelo Centrinho e o resto estava ocioso.
De um total de 556 servidores USP que estavam lotados no HRAC no momento da transição, 522 assinaram um Termo de Anuência e passaram a prestar serviços ao HC Bauru – sob administração da Faepa, mas mantendo o vínculo empregatício com a universidade. Dentre os outros 34 servidores, 24 preferiram ser transferidos para outras unidades da USP e 10 estavam em período de suspensão contratual (por exemplo, em licença médica ou afastamento pelo INSS). Atualmente, o HRAC tem 497 servidores USP, do quais 488 prestam serviços ao HC Bauru.
Patrimônio preservado
A preservação do legado e a manutenção dos serviços prestados pelo HRAC foram uma preocupação central desde o início do processo de transição para o HC Bauru. Havia o receio de que o atendimento humanizado e o perfil assistencial do Centrinho – que, muitas vezes, acompanha seus pacientes ao longo de toda a vida – se perderiam dentro de um grande hospital.
“A USP tem que proteger o patrimônio que ela construiu junto ao Centrinho”, destaca Santos – que, além da diretoria da nova faculdade, acumula o cargo de superintendente pro tempore do HRAC. Não só os serviços foram preservados, segundo ele, como foram reforçados pela disponibilidade de mais profissionais e de recursos complementares oferecidos pelo hospital. Por exemplo, com o acesso a equipamentos para a realização de exames de imagem, além de serviços de enfermaria e do centro de terapia intensiva.
“Todos os serviços do Centrinho estão funcionando regularmente e o número de atendimentos, inclusive, tem aumentado em relação ao que era feito anteriormente”, destaca, também, a professora Marília Buzalaf.
Uma prioridade para a nova faculdade é a contratação de docentes. Por enquanto, o curso de Medicina tem 22 professores, sendo que o número ideal previsto para o seu pleno funcionamento é 105. As contratações serão feitas à medida que servidores técnico-administrativos do HRAC forem se aposentando. Pelo acordo de cooperação firmado entre a USP e a Secretaria Estadual de Saúde, a reposição dessas vagas de caráter técnico-administrativo será feita pela Faepa; liberando, assim, os recursos que eram gastos com os salários desses funcionários para a contratação de novos docentes pela universidade.
Acompanhe as atividades do Hospital das Clínicas de Bauru clicando aqui e da Faculdade de Medicina de Bauru da USP no site neste link.
Fonte: Jornal da USP